Da matriz em São Paulo, aquele pequeno empreendedor, agora presidente, analisa os relatórios de perda e ganho das filiais da sua corporação. Boa parte deles no azul, faz o executivo de sucesso acreditar que seu negócio está sendo bem administrado pelos diretores que nomeou. Porém... O que ele não sabia era como esses relatórios estavam sendo manipulados por um dos diretores de uma de suas filiais.
Imagine a situação hipotética: “A secretária de uma das empresas atendidas pela agência de viagens solicita ao consultor de viagens uma reserva na classe executiva. A reserva é feita e o consultor a informa por email o valor e o prazo para a emissão da passagem aérea. Entretanto, a secretária se esquece de autorizar a emissão da passagem e a reserva é cancelada por prazo expirado. Mais tarde, a mesma é reativada, mas na 1ª. classe porque não há mais vagas na classe executiva. Para complicar mais ainda, a empresa se nega a pagar a diferença de tarifa alegando que era obrigação da agência ligar para a empresa informando sobre o vencimento do prazo.”
Situações como essa são comuns na rotina de uma agência de viagens, que com receio de perder a conta porque o viajante é o presidente ou um importante diretor da empresa, acaba assumindo esse prejuízo.
Então... Como esconder esse prejuízo do conhecimento da matriz? Eis a mecânica do golpe para fraudar relatórios sempre no azul:
- Crie um esquema de remuneração por comissão para ser adicionado ao salário fixo dos funcionários da empresa. É através desse esquema que você recrutará novos funcionários seduzindo-os com promessas salariais acima de R$ 2.000.
- Faça uma tabela escalonada de percentual de descontos para punir os funcionários toda vez que houver reclamação de clientes ou o não cumprimento de normas estipuladas pela filial. Mas só revele isso após a assinatura do contrato. Alguns exemplos de punição podem ser:
a) Desconto por não lançar bilhetes no sistema de back office da agência;
b) Desconto por gerar uma fatura para o cliente errado;
c) Desconto por gerar uma fatura com dados (centro de custos) incorretos; etc
- E o mais importante: no caso de demissões, deve-se demitir o funcionário com menos tempo de casa e de preferência, que não tenha ainda sido vítima desse golpe. Isso o ajudará a continuar aplicando o golpe sem seus superiores tomarem conhecimento.
Num universo de mais de 200 bilhetes emitidos por mês, atendendo e fazendo reservas ao mesmo tempo, é humanamente impossível ter 100% de acertos e justamente tirando proveito disso, é que esse golpe cai como uma luva para tampar o buraco financeiro que a matriz de uma empresa não vê.
Ao aplicar esse golpe, a administração da filial faz com que os prejuízos da agência sejam cobertos pelos descontos das comissões dos funcionários que são obrigados a se calar dada a necessidade do emprego. O golpe também beneficia o diretor, porque o seu salário é baseado no lucro da agência. Uma vez que não é gerado um relatório com prejuízos porque houve um desconto na comissão dos funcionários para cobrir esse rombo, o seu salário pago pela matriz passa a ser muito maior e ele ainda fica com fama de bom administrador!
As artimanhas administrativas aplicadas numa empresa são como as mágicas dos ilusionistas: elas só funcionam porque eles têm o apoio das assistentes de palco que sabem o truque. Ninguém frauda sozinho se não tiver um cúmplice. Para o sucesso desse golpe, o diretor precisa do apoio do supervisor de atendimento. É ele quem contabiliza os erros dos consultores de viagens para descontar 30%, 40%, 50% ou 100% das suas comissões com o seu aval.
E aí você tem a resposta para a pergunta: “Como pode um supervisor não ter qualificação alguma e se manter no cargo por tanto tempo, mesmo após pesquisas de avaliação que a matriz da agência faz para coletar informações sobre o desempenho dos seus funcionários?”
Esse conto é um exemplo de como certas informações são do conhecimento apenas dos funcionários subalternos. Trata-se daqueles boatos e fofocas que surgem nos bastidores de uma empresa e que aos poucos vão ganhando consistência. E quando a presidência pensa em agir, já é tarde demais! O funcionário demitido e vítima do golpe já deu entrada num processo na Justiça do Trabalho, clamando por uma indenização por Danos Morais de R$ 200 mil alegando que erro não é dano à empresa e nem ao cliente, como estipula a lei da CLT 468.
Quanto ao diretor... Esse pediu demissão e se tornou o mais novo empreendedor do mercado, após ter feito o seu pé-de-meia ao longo dos anos que esteve administrando a filial, deixando um prejuízo em dívida trabalhista para a matriz muito maior do que a soma de todos os prejuízos que ele camuflou nos relatórios da empresa.
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