Douglas Wires nasceu em 1971, é casado e mora atualmente no Rio de Janeiro, atuando no mercado de turismo desde 1995. Fluente em inglês, é emissor Amadeus e Sabre de passagens aéreas nacionais e internacionais. Trabalhou em empresas como: VARIG, OCEANAIR e CARLSON WAGONLIT, adquirindo sólidos conhecimentos e experiência em cálculos de tarifas aéreas, supervisão de reservas e negociação de serviços de viagens.

PRÉ-PAGAMENTO: O CALCANHAR DE AQUÍLES DO FINANCEIRO DE TODA AGÊNCIA DE VIAGENS

Atualmente, as agências de viagens corporativas negociam nas licitações com seus clientes o pagamento de passagens aéreas com cartão de crédito e o faturamento das despesas terrestres (hospedagens e locações de carro) com pagamento em até 15 dias após o recebimento da fatura do hotel.

Quando a agência utiliza ferramentas de reservas como GDS (Amadeus, Sabre, etc) e operadoras de viagens, é possível administrar o fluxo de caixa dentro do prazo de faturamento estipulado com o cliente porque na prática a agência de viagens gera uma fatura para o cliente pagá-la antes da data de vencimento da fatura do hotel emitida após o checkout do hóspede, para que com isso seu fluxo de caixa não seja afetado.

O calcanhar de Aquíles do financeiro de uma agência de viagens ocorre quando o hotel ou a pousada não fatura, o que obriga a agência de viagens pagar o fornecedor primeiro para receber do cliente depois. Isto é, todas as diárias são pagas antes ou no mesmo dia do checkin do hóspede. Isso abala o fluxo de caixa de qualquer agência de viagens porque o dinheiro que sai só retornará 30 dias ou 60 dias depois.


Imagine agora uma empresa off-shore, mineradora ou empreiteira que utiliza muito os serviços de logística de turmas de trabalho em regiões remotas onde não há grandes redes  hoteleiras. Geralmente, esses tipos de clientes solicitam hospedagens com períodos superiores a 15 dias e é aí que o fluxo de caixa da agência começa a esvaziar porque o tipo de acomodação desses hóspedes é em pousadas que não trabalham com faturamento. Nem ao menos sabem o que é HOTEL CARD! Pior ainda: essas pousadas não estão disponíveis nos GDS e nem nos sistemas de reservas web das operadoras de viagens, o que obriga o agente de viagem a reservar os quartos por telefone ou por email.

Para ilustrar esse artigo, vou mencionar um caso real, porém, trocando os nomes das partes envolvidas. A ironia nesse caso, é que é uma repetição do mesmo problema que aconteceu no começo do ano de 2014, com uma pousada localizada em Minas Gerais. Nessa época, a agência estava sem dinheiro para fazer o depósito bancário e tentou negociar pessoalmente com o dono da pousada para aceitar o faturamento mas ele recusou e ameaçou protestar a agência se  não pagasse o que devia. A agência pagou, mas teve que atrasar o pagamento de outros fornecedores até recompor o seu fluxo de caixa. Isso deveria servir de aprendizado mas parece que a administração da agência não soube se preparar para fazer um planejamento de pagamentos para os depósitos bancários futuros.
Em Julho de 2014, o problema com fluxo de caixa se repete. Desta vez com o hotel VISÃO INN. A secretária da empreiteira Ferro Forte, vamos chamá-la de Márcia, reservou diretamente com esse pequeno hotel 32 quartos de 1JUL a 1SET. Como sempre, ela negocia o bloqueio dos quartos em nome da sua empresa dizendo que a agência de viagens que atende a Ferro Forte irá fazer o depósito bancário dessas hospedagens.


Assim, ao receber seu email solicitando o pagamento do bloqueio que ela fez no valor total de R$ 269.824,00 (136.00 diária X 32 quartos X 62 dias) eu preenchi o formulário de depósito bancário da agência informando ao departamento financeiro para fazer 3 depósitos, com o intuito de parcelar esse valor e não pesar no fluxo de caixa da agência. Após o pagamento da primeira parcela, o departamento financeiro da agência me pede para dividir os depósitos do dia 22JUL e 13AUG em períodos menores com o intuito de diminuir o valor e com isso resolver o problema do fluxo de caixa. Afinal de contas, não era somente a Ferro Forte que solicitava à agência hospedagens em hotéis que não faturavam. Existia também outras empresas e naquela semana a soma dos depósitos chegava ao montante de R$ 905 mil!

CRONOGRAMA ORIGINAL ACEITO ( A CONTRA-GOSTO )
PELO HOTEL VISÃO INN
PERIODO
VALOR
DEPOSITO AGENDADO
01JUL A 20JUL
R$ 82.688,00
09JUL
20JUL A 11AUG
R$ 95.744,00
22JUL
11AUG A 01SEP
R$ 91.392,00
13AUG


CRONOGRAMA REAGENDADO APÓS INTERVENÇÃO DO FINANCEIRO DA AGÊNCIA E REJEITADO PELO HOTEL VISÃO INN
PERIODO
VALOR
DEPOSITO AGENDADO
01JUL A 20JUL
R$ 82.688,00
09JUL
20JUL A 29JUL
R$ 39.168,00
22JUL
29JUL A 11AUG
R$ 56.576,00
07AUG
11AUG A 21AUG
R$ 43.520,00
13AUG
21AUG A 01SEP
R$ 47.872,00
27AUG
  
Feito isso, encaminhei o novo cronograma acima para o hotel, forçando-os mais uma vez a aceitar as datas desses novos depósitos com a alegação que a agência de viagem não poderia fazê-los integralmente (R$ 269.824,00) e nem fazer depósitos adiantados das semanas subsequentes sem ter certeza que os quartos foram ocupados. Então recebo como resposta da diretoria do hotel VISÃO INN que minha alegação contrariava o acordo de pagar todas as hospedagens, mesmo as não utilizadas e que foram negociadas pela Márcia em nome da empresa Ferro Forte. Para complicar mais ainda, o gestor de contas da Ferro Forte se negou a pagar qualquer fatura do hotel VISÃO INN que fosse emitida antes da data de checkout do hóspede.

Para sorte da agência, o gestor de contas da Ferro Forte, indignado pela política inflexível da diretoria do hotel em não aceitar o faturamento após várias tentativas de contato por email, determinou que os funcionários hospedados no hotel VISÃO INN fossem reacomodados em outras pousadas da cidade que aceitavam faturamento como represália à política do hotel de exigir o pagamento imediato do cronograma original anteriormente informado.

Represálias comerciais como essa são comuns no mundo corporativo e já testemunhei outros casos de boicotes como esses por outras empresas: seja para forçar um fornecedor a mudar a sua política de pagamento, ou por insatisfação pelos seus serviços prestados. Isso chega até ser uma ameaça de falência para um hotel, se considerarmos que só existe uma única empresa multi-nacional na cidade e que toda a economia local depende dela. Por outro lado, também não é raro encontrarmos hotéis que impõem suas políticas de mercado sobre as empresas que necessitam de apoio logístico em alguma cidade onde a falta de concorrência as tornam reféns das diárias disponibilizadas e de uma parceria corporativa mais flexível, como a isenção da taxa de NOSHOW. Esse é o caso na cidade de Campos dos Goytacazes (RJ).

Para a agência de viagens, fica uma lição: quando fizer um contrato de licitação, inclua uma cláusula que especifique que no caso de pré-pagamentos, as faturas serão emitidas no dia do depósito bancário feito na conta do fornecedor (hotel) e encaminhadas ao cliente com o comprovante de depósito bancário no lugar da nota fiscal, para que com isso seu fluxo de caixa não seja abalado esperando até dois meses para receber esse dinheiro de volta... E sem juros.

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